Tipicamente, o verão traz consigo, para além do calor e bom tempo, uma diminuição “da ação” ou seja uma redução da atividade bolsista na generalidade das praças financeiras. Estes são meses que se caracterizam também (teoricamente) por uma menor intensidade de acontecimentos / eventos políticos e económicos relevantes, o que leva os media (e os investidores) a desviarem as suas atenções para assuntos mais triviais ou frívolos por falta de “grandes notícias”. Esta época do ano é assim por muitos designada como a “Silly Season” dos mercados financeiros.

No que diz respeito a rentabilidades este é também um período por norma menos favorável, por exemplo, quando comparamos a rentabilidade do mês de agosto face à rentabilidade anual do índice global na última década ficamos com a clara noção que agosto tem muitas observações negativas e algumas de dimensão relevante:

 

 

Analisando os últimos cinco verões, os meses de agosto foram pródigos em eventos disruptivos e, consequentemente, de perdas para a generalidade dos investidores:

 

2015 - O colapso das bolsas chinesas. O verão de 2015 foi agitado, marcado pelos receios dos efeitos de um abrandamento acentuado da economia chinesa na economia mundial, que acabou mesmo por culminar numa desvalorização pronunciada do yuan. O resultado foi uma queda do S&P 500 em mais de 12% desde o seu pico no espaço de uma semana! Também o escândalo da Volkswagen abalou as bolsas o que acabou por pressionar fortemente particularmente as empresas do setor automóvel e as suas fornecedoras de componentes.

2016 – O Brexit. Os mercados experienciaram em 2016 uma invulgar bonança, julho e agosto foi marcado por uma acalmia após as violentas correções (e sobretudo a volatilidade) que caracterizou o mês de junho, na sequência do referendo à permanência do Reino Unido na União Europeia e do algo inesperado, Brexit! As perdas em agosto foram por isso de pequena dimensão.

2017 – O Taper Tantrum da FED. Os meses de estio de 2017 pautaram-se pelo receio dos investidores relativamente ao ritmo de normalização da política monetária da FED. A FED estava em pleno processo de retirada de estímulo monetário e subida das taxas de juro e, depois de anunciar a segunda subida de taxas do ano em 25pb (para o intervalo 1%-1.25%), a FED reforçou o seu compromisso de diminuição do balanço (através da diminuição do reinvestimento de títulos que, entretanto, maturassem) reduzindo assim o apoio monetário à economia norte-americana. O mercado reagiu ao receio da redução (demasiado rápida) dos estímulos com uma subida das yields do tesouro norte-americano e queda das bolsas.

2018 – Itália. Neste ano, a turbulência teve como foco a Europa e especificamente Itália. As negociações para o Orçamento de Estado Italiano de 2019 geraram uma crise política e consequentemente turbulência interna e externa atingindo particularmente outras economias da periferia europeia (entre as quais Portugal). Pressionado internamente, o executivo de Roma optou por desafiar abertamente Bruxelas relativamente às metas para o défice das contas públicas, num contexto de muito baixo crescimento da economia (em torno de apenas 1%) e de sobre endividamento público muito grave com rácio dívida pública / PIB a aproximar-se dos 135%!

2019 – As tensões comerciais entre China e EUA: O ano de 2019 foi um ano fantástico para os investidores, mas o seu verão ficou marcado pelo regresso em força da volatilidade e turbulência aos mercados financeiros. Na base desta agitação, que culminou em variações intra diárias dos principais índices bolsistas mundiais expressivas e polarizadas, estiveram fatores como o agravar das tensões comerciais entre EUA e China, a divulgação de dados macroeconómicos menos positivos e ainda uma vaga renovada de políticas monetárias expansionistas, implementadas pela generalidade dos bancos centrais mundiais que acabaram por animar as bolsas durante os meses mais quentes do ano!

2020 - ?? Depois de uma primeira metade de um ano histórica e repleta de turbulência, será agosto de 2020 também marcado por semanas tórridas a nível bolsista ou tal como ocorreu em 2016 com o Brexit teremos um verão marcado pela bonança?  Existem vários eventos que podem potencialmente ser disruptivos e contribuir para uma maior agitação: o aproximar das eleições presidenciais norte-americanas de novembro; a própria evolução da pandemia quer pelo risco de uma segunda vaga quer pelas consequências económicas, políticas e sociais; a resposta política a esta crise (particularmente relevante na Europa onde ainda não existe um acordo); risco de agitação a nível social / convulsão social devido ao aumento do desemprego / pobreza quer na Europa quer nos EUA, mas particularmente em países emergentes onde os sistemas de apoio social são inexistentes / mais frágeis.

 

Teremos uma “silly sick season” ou apenas uma “silly crazy season” animada pelo desconfinamento?! Seja qual for a resposta, a prudência aconselha uma atitude particularmente vigilante nas próximas semanas!